Alcácer do Sal é uma antiga vila alentejana, banhada pelo rio Sado. Outrora designada por Salácia, no tempo dos romanos, era nesse tempo um local cujos moradores auferiam de privilégios comuns aos cidadãos de Roma, estatuto esse que se prolongou inclusivamente durante o domínio Visigodo e Árabe. O seu gabarito era tal, que o castelo hoje em ruinas, era o mais forte da Península Ibérica, com uma torre central de 27 metros e 30 torres de pedra com 25 metros de altura.
Esta vila viria a ser conquistada definitivamente em 1217 por D Afonso II. Nesse dia, ao entrar finalmente em Salácia afungentando os Mouros, a confusão instalada foi tanta que todos começaram a fugir: uns pelas portas abertas, outros saltando precipidamente das janelas, outras ainda conseguiram escapar por túneis subterrâneos aparentemente secretos. Porém, uma pequena menina ficou esquecida no meio de toda aquela precipitação, não se sabendo se abandonada, esquecida ou por os seus pais terem morrido. Era tão pequenina ainda, que mal sabia falar, apenas conseguindo dizer o seu nome: Almerinda.
As pessoas que por ela passavam, compadecidos com a sua fragilidade e inocência perguntavam-lhe as mais diversas coisas, mas a pequena, assustada e com os olhos muito abertos, nada conseguia explicar, limitando-se a soltar soluços de tristeza, com o seu rosto escondido atrás das pequenas mãozinhas.
Assim, a menina por ali ficou, tendo sido recolhida no castelo. Teve a sorte de encontrar pessoas boas que dela cuidaram, lhe deram amor, atenção e um lar. Assim cresceu. Almerinda era esperta e dotada, pelo que rapidamente aprendeu a tocar alaúde mostrando ainda uma forte vertente para poesia, fazendo frente a qualquer trovador que por ali passasse.
Apesar de aparentemente de nada se lembrar sobre a tragédia ocorrida na sua infância e de ter sido muito amada por quem a criou, a jovem encerrava dentro de si uma tristeza inexplicada, feita de saudades do que não conhecia.
Os cavaleiros que passavam pelo castelo encantavam-se de a ouvir tocar, e Almerinda honrava-os com os seus poemas, brindando-os com um sorriso ausente, longínquo e intocável.
Certo dia uma cavaleiro de nome D. Gonçalo chegou a Alcácer do Sal. Como qualquer outro cavaleiro, quis conhecer o sorriso da já tão famosa Almerinda. Apesar de D. Gonçalo não ter uma beleza que arrebatasse corações, atingiu em cheio o coração da jovem que por ele ficou enamorada.
A partir desse dia, Almerinda não mais sorriu aos outros cavaleiros. Encostava-se sim às paredes da sua torre cantando:
“Pois é mais vosso que meu,
Senhor, o meu coração
Pois vossos cativos são
Meus olhos, lembro-vos eu.
Lembro-vos minha tristeza,
Que jamais nunca me deixa,
Lembro-vos com tanta queixa
Se queixa minha firmeza.
Lembro-vos que não é meu
O meu triste coração
Pois tendes tanta razão
Meus olhos, lembro-vos eu.”
D. Gonçalo bem a ouvia, sabendo que os olhos que a jovem cantava eram os seus, no entanto não se atrevia a abordá-la.
Certa noite, D. Gonçalo agarrando-se a toda a coragem que possuía, ouvindo de novo o cântico de Almerinda, encostou-se à parede do terraço da torre e timidamente cantou:
“Mais digna de ser servida
Que senhora deste mundo
Vós sois o meu deus segundo
Vós sois meu bem desta vida.
Vós sois aquela que amo
Por vosso merecimento
Com tanto contentamento
Que por vós a mim desamo
A vós só é mais devida
Lealdade neste mundo
Pois sois o meu deus segundo
E meu prazer desta vida”
Almerinda ouviu e rendida aos encantos do jovem cavaleiro, exclamou:
-Oh meu senhor D. Gonçalo!
O resto, não conta a lenda, mas diz –se que em noites de luar de Agosto ouvem-se os sussuros dos dois amantes eternamente encantados nas muralhas da velha Salácia romana.
Autoria:
PNMF
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